Desde a tragédia da Vale em Brumadinho que o governador
Romeu Zema vem colecionando críticas veladas pelo seu otimismo, principalmente
ao abordar o tema da mineração em crise no estado. Por causa de suas
declarações notadamente positivas, de
esperança no futuro e fé na vida pública, muitas vezes ele é visto igualmente
como ingênuo.
Por pensar assim, o nosso governador pode estar sozinho,
cercado de maus agouros, desde parte da imprensa até alguns de seus
colaboradores mais próximos. Mas nem tudo está perdido. Pelo contrário. Só
otimismo e ingenuidade jamais o levariam aonde chegou. Mas podem ajudá-lo, e
muito, na missão “quase impossível” que abraçou e o faz levantar todos os dias
difíceis que vivemos.
Foi o que fiquei matutando dia desses, lembrando-me de Zema
e das nossas Minas Gerais, após ouvir um comentário do colega Lourival
Sant'Anna, na Rádio CBN, sobre o que de mais desafiante e real aconteceu em
Ruanda, na África. Alguém aí, caros leitores, já assistiu ao filme “Hotel
Ruanda”? Pois o alugue de novo. Aquilo tudo (um país sem natureza, com quase um
milhão de habitantes se matando a golpes de facões) virou passado e perdão.
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Foto: Bruno Peres |
Ex-colônia da Bélgica, entre os dias sete de abril e quatro
de julho de 1994, esse território africano já aquecido pelas mudanças
climáticas foi palco de um dos piores genocídios ocorridos na face tórrida da
Terra. Um verdadeiro massacre perpetrado por extremistas hutus contra tutsis e
hutus moderados, os seus dois maiores grupos éticos. Uma rivalidade que se
acentuou com o passar do tempo, dada à escassez ambiental de terras para
plantio e a sua fraca economia nacional não diversificada, basicamente
sustentada pelo cultivo e exportação de café. Isso, até 1989, quando o preço da
saca foi reduzido à metade, fazendo o país praticamente dependente de um único
produto, perder em 40% a sua renda oriunda das exportações. A partir daí,
Ruanda tornou-se uma das nações mais pobres do planeta. E a que também mais
reagiu a partir disso: virou case de sucesso em gestão econômica governamental.
A "Cingapura" da África
Foi o que continuei ouvindo no rádio. Em apenas duas décadas
e meia depois do genocídio que exterminou cerca de 800 mil dos seus sete
milhões de habitantes e, na sequência, mandou para o exílio parcela
considerável de sua antiga força de trabalho, Ruanda vive hoje em ritmo de
crescimento acelerado em torno de 9% ao ano. Por motivos óbvios, tem 60% da
população abaixo dos 30 anos e um dos parlamentos mais femininos do mundo (64%
de mulheres na Câmara e 40% no Senado). É ainda considerado um dos lugares mais
seguros da África e também um dos mais estáveis politicamente.
Segundo a escritora Scholastique Mukasonga, que perdeu
praticamente toda a sua família durante os massacres, Ruanda se tornou, sim, um
modelo possível para o mundo. E pode inspirar o Grande Sertão, já sem veredas,
que trazemos dentro e fora da gente: “As pessoas que nos visitam hoje constatam
o resultado do desenvolvimento econômico, da luta implacável contra a corrupção
e o lugar que as mulheres têm. A segurança que reina na capital Kigali leva as
grandes empresas a estabelecerem suas sedes em Ruanda. Nós sonhamos ser, enfim,
a pequena Cingapura da África” – disse ela.
E, detalhe final em termos de ecologia humana e social
reportada, in loco e ao vivo, por Lourival Sant'Anna na CBN: “Nem moradores de
rua pedindo esmolas são mais vistos hoje em Ruanda”, ele confirmou.
Eu desliguei o rádio, com esperança novamente no ser humano.
Como diria José Carlos Carvalho, nosso ex-secretário e ministro de Meio
Ambiente, diante da insustentável beleza do mundo “nenhum de nós tem mais tempo
para ser pessimista”.
E lembrei-me, indagativo, do governador: e quanto a Minas,
destroçada temporariamente pela mineração insustentável? E quanto ao Brasil,
que tem um ministro do Meio Ambiente que é contra o Meio Ambiente? E o Planeta
Terra, onde todos os dias do ano deveriam ser dias mundiais do Meio Ambiente,
de reflexão, e não somente hoje, 5 de junho?
Continue otimista, Zema!
Depoimentos de Esperança
Diversificação
“Estamos iniciando a era pós-tragédias em Minas Gerais.
Brumadinho será a última. Queremos que a nossa economia venha se diversificar
mais. A mineração sempre foi e continuará importante, mas outras atividades
precisam surgir e dinamizar o nosso desenvolvimento de maneira sustentável. Nós
temos de mudar a mentalidade reinante no Brasil de que mais regulamentação e
leis é que proporcionam melhor desempenho.”
Reinvenção
“Nós temos uma das legislações tributárias mais complexas do
mundo e, apesar disso, um alto grau de informalidade e sonegação. Nosso Supremo
Tribunal Federal é o único no planeta que julga habeas corpus, em vez de
questões de caráter superior. Somos um país que, de certa maneira, precisa se
reinventar. Essa cultura burocrática que herdamos tem impedido e muito, que nos
tornemos uma sociedade mais eficiente e mais rica.”
Expectativa
“A nossa expectativa de vida atual é a maior de todos os
tempos. A segurança que temos é a maior de todas as eras. Nunca se teve tão
poucas guerras. Quando eu falo isso é comparando séculos e não pequenos
intervalos, porque algumas recaídas podem acontecer. As condições de trabalho
nunca foram tão boas quanto agora. Temos de lembrar que viemos de um país de
escravos e que trabalho, no passado, era algo que quase condenava uma pessoa à
morte. Nunca tivemos tanto bem-estar, moradias, transportes e, principalmente,
tanta liberdade de expressão e transparência.”
Confissão
“Eu só virei governador exatamente por causa do meu
otimismo. Foi o que mais escutei durante minha campanha, e ainda escuto: ‘Você
é louco de querer assumir um estado como Minas Gerais’. Mas busco me lembrar
sempre que desafios é o que, muitas vezes, nos mantêm vivos. Escalar o Monte
Everest, em vez da Serra da Mantiqueira, todo mundo sabe, é bem mais
desafiante. O que o meu governo quer fazer é exatamente isso. É apossar-se
desse tamanho desafio que temos pela frente.”
Otimismo
“Eu quero sempre demonstrar o meu otimismo. Qualquer pessoa
que pegar um livro de história e entender um pouquinho do que aconteceu com a
nossa raça tem todos os motivos para ser extremamente otimista.”
“Estou otimista também porque Minas está intacta,
diferentemente de um país como a Síria, totalmente arrasada e destruída. Caso a
economia do mundo, do Brasil e do mundo venha a reagir, a nossa produção tem
condição de aumentar rapidamente, em questão de meses, até 40%, que é uma
capacidade gigantesca.”
Renascimento
“Muitas vezes as tragédias nos obrigam a construir um mundo
novo e melhor. Japão e Alemanha são dois grandes exemplos dessa possibilidade
real. Eles foram países arrasados por duas guerras mundiais e hoje estão entre
os mais prósperos, justos e com melhores índices de bem-estar do mundo para as
suas populações. Fazer dessas nossas tragédias um futuro melhor é tudo que
queremos. Só depende de nós.”